segunda-feira, 26 de outubro de 2009

CONSTRUÇÃO CASEIRA DE EQUIPAMENTOS QRP: idealização e construção de um transceptor para as bandas de 80m, 40m e 20m. (Julho 2006)

Decorria o ano de 1974 (tinha eu 12 anos) quando me foi dado a conhecer o mundo fascinante da rádio comunicação. Foi para mim (é para mim) um privilégio ter tido a oportunidade de beber dos ensinamentos, e da experiência, dos colegas que já há muitos anos praticavam e experimentavam as técnicas dos equipamentos e das comunicações.
Fui então aguardando ansiosamente o dia em que completaria o meu 16º aniversário, pois, por imposição legal, só nessa altura me poderia submeter à prestação de provas de exame para a obtenção da minha carta de rádio amador, o que só aconteceria no ano de 1978, mas enquanto isso durante esses quatro anos ia exercitando na banda de CB.
Após a aprovação no exame para a classe D (na altura a classe dos iniciados), a obtenção de indicativo próprio só era possível após decorrido um período de 2 anos a operar como 2º operador da estação de um amador já encartado, e o indicativo só poderia ser atribuído se no final desse tempo não existissem infracções nem a participação de queixas. E assim me submeti a um período (de purgatório) durante o qual operei a estação de CT4YI (minha mãe).
Utilizava um FT101 da YAESU apenas com uma válvula 6SJ6 no andar final, uma vez que, na altura, para a classe D a potência de dissipação anódica máxima autorizada era de 30 W (por duas vezes recebi a fiscalização dos serviços radioeléctricos para confirmarem que não excedia a potência legal, velhos tempos !!!). Durante esse tempo utilizei sempre como sistema radiante, nas bandas de HF, uma antena G5RV alimentada com fita paralela, que era muito utilizada nas antenas de televisão, e cuja adaptação era efectuada através de um sintonizador/acoplador de antena construído pelo CT4KV (meu pai). Com essa estação passava largas horas em DX, nas bandas dos 14 MHz e 28 MHz, onde (nesses anos) se trabalhava com grande facilidade as estações VK, ZL e JA, o que para um novato com eu era fascinante (vivia absolutamente em êxtase). Finalmente, decorrido o tempo de purgatório, obtive o indicativo CT1AHM, aquele que detenho actualmente.
Em 1981 as obrigações estudantis obrigaram-me a deslocar para Coimbra e a fazer interregnos mais ou menos prolongados. No entanto, o “bichinho” que todos nós sentimos não me deixavam esquecer este mundo maravilhoso que é o rádio amadorismo.
Ao longo dos últimos anos, e principalmente com a facilidade que a Internet nos trouxe, comecei a ter contacto com o mundo aliciante dos “QRPistas”. Embora, para muitos amadores amantes do QRO pareça ser “marterizante” a recepção de estações que operam com baixas potências, e muitas vezes sejamos desencorajados de operar nesse modo, a verdade é que, felizmente, o incentivo que muitos outros colegas nos dão enchem-nos de prazer, satisfação e coragem para prosseguirmos.
Ao longo de todos estes anos fui idealizando e construindo vários equipamentos de medida, receptores e emissores, obviamente sempre QRP. No final do ano passado, comecei a idealizar e a conceber a construção de um transceptor de SSB, que me possibilitasse a operação nas bandas de 80m, 40m e 20m.
A figura 1 mostra o diagrama de blocos do transceptor. Conceptualmente, possui uma arquitectura em tudo idêntica aos equipamentos de fábrica de há alguns anos atrás.


Figura 1– Diagrama de blocos do transceptor tribanda de SSB.


O receptor:
O sinal de antena é aplicado ao primeiro bloco de filtro passa banda (BPF) e de seguida entregue ao amplificador de banda larga (Broadband), montado numa configuração push-pull e constituído por 4 transistores FET (2SK125), proporcionando um ganho de 10 dB.



Figura 2- Filtros passa banda (BPF) para os 80/40/20m

Os sinais amplificados são entregues ao segundo bloco BPF. Os circuitos BPF foram desenhados (e afinados) para possuírem uma impedância de entrada e saída de 50 Ω. O sinal de RF é então aplicado ao misturador duplamente balanceado (SBL1).
Este misturador recebe a frequência do oscilador local (OL) que trabalha numa frequência 9 MHz acima da frequência dos sinais recebidos na antena. Este oscilador é constituído pelo VFO (5 - 5,5 MHz) e por um misturador (NE602) com três cristais fixos (um por cada banda).



Figura 3- Circuito heterodino do oscilador local (LO).



Relativamente ao VFO o esquema de base foi-me dado pelo colega CT1PL (Rogério) e é um projecto publicado na revista QST (edição americana) à já alguns anos, e desenvolvido por W1FB (Doug DeMaw), considerado por muitos um decano dos radioamadores especialmente pelos QRP, e que infelizmente há poucos anos passou a QRT. Para os que tiverem curiosidade e interesse sugiro uma busca no Google e poderão verificar a quantidade de projectos de sua autoria especialmente nos sites dedicados ao QRP. Com algumas modificações e ajustes efectuados, este VFO depois de construído apresenta um drift de 10Hz/hora (!!!) e a comprovar a sua estabilidade na frequência estão por aí vários colegas que o podem atestar. Neste momento está já em construção um circuito DDS (já testado no transceptor) controlado com um controlador PIC e com leitura digital da frequência para substituição completa do oscilador local, OL.



Figura 4- Vista interior do VFO

A diferença entre o OL e o sinal de antena, obtida na saída do misturador (9 MHZ), é amplificada 6dB por um transístor 2N3866 para compensar a perda intrínseca ao tipo de misturador que foi utilizado, e depois passada pelo filtro de cristal de 6 pólos com uma largura de banda de 2,2 KHz/6dB. A sua saída é aplicada ao amplificador de FI onde utilizei dois MOSFET de dupla porta (BF981).



Figura 5- Cristal 9MHz e FI (vista superior).


Como detector de produto utilizei um segundo SBL1, ao qual se aplica o oscilador de portadora para reconstituir o sinal de áudio que depois é amplificado por um LM386 e entregue ao altifalante.


O emissor:

O sinal do microfone é amplificado por um circuito com dois transístores e aplicado ao modulador balanceado, para o qual utilizei o velho conhecido MC1496. Como esquema de montagem, segui na íntegra um dos que são apresentados nas folhas de dados disponibilizadas pelo fabricante. Este circuito recebe também o oscilador de portadora (9MHz +/-1,5KHz) para produzir as componentes LSB e USB. A trabalhar à frequência de 9MHz este modulador consegue uma atenuação de -55 dB na portadora, considerando uma portadora na entrada com 200mV (valor eficaz).

Figura 6- Modulador balanceado e osciladores de portadora para LSB/USB


O sinal assim produzido é passado pelo filtro de cristal e misturado com o OL, obtendo-se após a mistura o sinal já na frequência que será posteriormente entregue à antena.
A saída do misturador é entregue ao BPF e amplificado por dois estágios, o pré-drive (2N2222) e drive (2N4427) ambos de banda larga e polarizados em classe A, por razões óbvias.
A saída do drive é aplicada ao amplificador de potência (PA) que utiliza uma configuração push-pull com dois transístores 2SC1971.

Uma vez que o PA é do tipo banda larga “Broadband”, o sinal de RF antes de ser enviado para a antena passa por uma bateria de filtros passa baixo (LPF) para atenuar os harmónicos de ordem superior.


Figura 8- Filtros passa baixo (LPF) utilizados entre a saída do PA e a antena.

Todo os circuitos montados em placas de circuito impresso de base epóxy, foram estrategicamente desenhados e montados de forma a caberem dentro de uma caixa de um transceptor CB, gentilmente oferecida pelo CT2GCO (Mesquita) ao qual agradeço publicamente, e que foi aproveitada para a montagem.


Figura 9- Imagem do transceptor 80/40/20m.


Nestes modos de operação, com baixas potências, é absolutamente necessário a utilização de sistemas irradiantes muito eficientes. Actualmente utilizo uma antena de quadro horizontal alimentada a meio de uma aresta com uma linha de 450 Ω (com janelas), a qual vai ligar a um sintonizador/adaptador de impedâncias com entrada balanceada.
Este adaptador (do tipo Z-match) foi construído segundo um artigo publicado por Louis Varney (G5RV) na revista RadCom, em Outubro de 1985 (publicação oficial da RSGB, congénere inglesa da REP). Embora seja do conhecimento o célebre Louis Varney é o autor da famosa (e muito criticada) antena que possibilita a operação multibanda, baptizada com o seu indicativo G5RV, e infelizmente desaparecido à 3 ou 4 anos, tendo este facto sido referenciado nas diversas publicações inglesas e que muito o homenagearam devido aos seus estudos e contribuições em vários estudos e publicações técnicas.



Figura 11- Adaptador (Z-match) de entrada simétrico e saída assimétrica

Este dispositivo permite-me, com uma antena de quadro (horizontal) de uma onda completa na banda de 80m, operar também os 40m e os 20m. O sistema irradiante, principalmente nas bandas de 80m e 40m tem-se mostrado muito eficiente em particular para comunicações dentro de Portugal e em toda a Espanha, dado o elevado ângulo de radiação que a antena possui. A título informativo, têm sido possíveis comunicações em SSB entre Coimbra e todo o território nacional, e também com o norte e o sul de Espanha, com potências compreendidas entre 0,5W e 3W e com sinais, no correspondente, entre 5/9 e 5/9+20dB, contudo, não esqueçamos também a ajuda sempre preciosa da Dona Propagação.
Espero que estas linhas sirvam de motivação para que outros radioamadores, QRPistas ou não, se motivem e apresentem também os seus projectos e as suas construções (sei que os há por aí). Parafraseando um radioamador muito assíduo dos 80m “está por aí algum radioamador escondido atrás do microfone?”.
Numa próxima oportunidade aproveitarei para lhes descrever outros equipamentos, nomeadamente um pequeno amplificador de CB, modificado para trabalhar nos 80m e que com uma excitação de 1W (e por 50 €) é possível obter entre 30 e 40 Watt. Existem também outros projectos já na calha estando para breve um transceptor mono banda para os 18 MHz. Até lá boas montagens e bons QSO’ s, naturalmente em QRP.

1 comentário:

  1. Sou um Radio amador muito recente, e o pouco que sei praticamente ninguém me ensinou, mas recuso-me a baixar os braços, e esta perto o meu segundo exame obrigatório, não cultura pedagógica radioamadorística em Portugal como acontece noutros Países, aqui é quase um para cada lado!

    Desde já o meu muito obrigado, pelo seu trabalho, e vou ser um seguidor atento das suas publicações, prometo e vou chateá-lo um bocadinho!

    Devíamos lutar por um curso anual, pelo menos anual de radioamadores!

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